Monday, June 22, 2009

Dúvidas



"Toma-se um homem
feito de nada como nós"

Feito de nada, nem mesmo de desejos e esperanças.

E pergunta-se: "É isto um homem?"

Não responda.

Qual é afinal a receita para se fazer um herói? O negativo absoluto, antes o nem mesmo do que o nada, ou o ser?

Saturday, June 20, 2009

Afastamento e afeto


"Who needs a heart that never bleeds
Never retreats and never needs
If it's all alone"

Tentações. Medo irracional de se decepcionar ou a certeza plena de que estava com a razão? Este era o problema que lhe incomodava no momento. Aliás, um problema que sempre lhe incomodara, uma vez que nunca se decidira à exposição plena e nem ao recolhimento total. Neste ponto a dialética lhe servia. Em alguns outros momentos também, é verdade, mas, enquanto fuga, a busca por uma relação que permitisse esconder o fato de que ele não teria a coragem necessária para se decidir representava tanto o conforto que mascara o egoísmo quanto o passividade do comodismo mais ridículo.

No final das contas não era mais que a retomada da questão sobre entrar no mundo ou não. "Vão-se os anéis e ficam os dedos" teria pensado. Mas neste momento procurava evitar os clichês, pois estava seriamente em dúvida. Por muito tempo fora fácil seguir o ensinamento do Inferno, "O outono aqui dentro, a primavera lá fora", ensinamento que impelia à escolha que agora lhe parecia por demais pesada. Não errada.

Pesada. "It's not dark yet, but it's getting there" aprendera com outra pessoa. Talvez ainda houvesse tempo, pelo menos o suficiente para mais decepções, arrependimentos e negações. E mesmo que este tempo viesse a reforçar sua certeza de que aquilo seria tão falso quanto a própria vida, ainda havia tempo e haveria depois. Tempo para compactuar, portanto.

***

"Aquele que se recusa a participar corre o risco de considerar-se melhor que os outros e de no seu interesse privado fazer mau uso da crítica da sociedade como ideologia. Enquanto busca fazer da própria existência uma débil imagem da verdadeira, deveria ter presente essa fragilidade e saber quão pouco a imagem substitui a vida verdadeira" (Adorno em Minima Moralia)

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Já não acreditava ter a força e a austeridade necessárias ao exercício da sobrevivência como a desejava, com o afeto universal e indistinto ao desconhecido. Pelo contrário, parecia-lhe mesmo uma opção calculada, como uma dança solitária na qual o prazer vem da subversão de si, da certeza mantida em segredo de que poderia ter feito aquilo que não fez e sido o que não foi. Esta, no entanto, não era uma escolha e sim um fardo. E ainda que momentâneo, dado que a esperança subsistente não lhe seria dada, este fardo parecia escarnecer de sua capacidade de ser, criar e, mais ainda, acreditar.

Enfim, uma inoportuna lufada de perfume no ar outonal, seco, que se respira no Inferno. Como são, afinal, inoportunas todas as tentações.

Thursday, June 18, 2009

Tic-...

O tempo passa de dois em dois minutos.

Tuesday, June 16, 2009

Qual homem?


"Lost in a movie script
With no word left to say"

Sentado atrás dos vidros, aquela chuva parecia trazer o horizonte para mais perto ainda. Ele que já estivera tão longe, agora parecia uma decrépita mistura de medo, decepção e falsidade. Vodca talvez, mas falsidade certamente. A falsidade de um desejo que causa medo, de uma decepção sem motivos ou de um afastamento auto-infligido do qual não se sabe ao certo a função. Naquele momento o vidro lhe oferecia a proteção necessária a alguma beleza que talvez ainda resistisse ali dentro, mas, em algum momento - e isto lhe parecia claro como o cinza que observava -, este mesmo vidro serviria como uma barreira para que a sujeira acumulada durante anos de arrogância, mentiras e delírios não fosse vista de fora. Não lhe interessava, aliás, ser objeto. nenhum tipo de objeto. Já na quele momento havia dúvidas. "Proteger o que, afinal? Ou ainda esconconder o quê?"

E lembrava-se de que, mesmo que à noite não esteja escuro, ainda se pode sonhar. E ainda que o sonho parecesse um abraço partido, seria um abraço. Uma questão simples, aliás, dado que, entregue às tentações estas não mais o são, mas também não mais é forte o homem.

Thursday, June 04, 2009

Alma



"All I hear is the sound
Of rain falling on the ground"

Mais distraído do que atento, tentava dar corpo aquilo que ouvia, mesmo sabendo que nada daquilo lhe interessava muito, agora ou no futuro. O que, de certa forma, revelava que o futuro já acontecia em cada um daqueles suspiros de afastamento.
E também que o nada era, talvez, o corpo que tentava dar a tudo aquilo.
De qualquer forma, mesmo o nada haveria de ser tão presente, tão material, quanto aquelas garrafas de bebida, pois não apenas estava ali como também pesava mais sobre ele do que a própria presença dos outros. "Se não existe barulho quando a árvore caí longe de todos, haverá alguém, afinal, quando este for o mais forte dos homens?". Pensar sobre este futuro, claro, não lhe agradava, não ali. Mas, ao se afastar pretendia impedir que este problema chegasse, já que este era, afinal, a consequência da vida.
E assim parecia formar, finalmente, uma imagem daquilo que lhe diziam naquele momento. Uma imagem que não apenas reforçava sua certeza de que não tinha expectativas de passar por aquilo de novo, mas que também mostrava-lhe que

* (ops) ... o caminho já estava pronto.