A gaiola e os pássaros

Até aquele dia, o dia em que, não mais que de repente para alguns tantos quantos haviam os que já haviam desacreditado deste dia e os que achavam que já era tarde demais, os púlpítos foram ocupados por aqueles que achavam chegada a hora. Ironicamente, o meio para que isso se desse foi uma proibição ao uso de púlpitos, por aqueles que, provavelmente por ocuparem patamares mais altos esqueciam que falavam com quem se apoiava em poleiros estreitos. A partir daquel dia, quem quisesse cantar, que cantasse com todos, pois alguns ouvidos sofridos pelas pelejas internas já não podiam suportar o fato de terem se tornado invisíveis. Assim, alguns sofreram, mas aquele passou a ser um lugar no qual parecia não mais haver música.
Parecia, pois quando alguém se lembrou de que, afinal, eles não estavam ali apenas para cantar, mas também para viver e, vivendo, fazer vidas que não se limitassem às suas, passou-se a olhar sorrateiramente para eles, esperando descobrir se estavam mortos, talvez numa micro guerra civil. E qual não foi seu espanto ao descobrir que todo o poder que detivera até então, por maio do qual tentara fazer-lhes achar que nunca cantariam juntos de verdade, que esse poder fora derrotado, simplesmente porque eles entenderam que antes de mais nada, só se pode cantar para todos se todos puderem cantar.
E aqueles pássaros fizeram sua greve, aquela gaiola tornou-se estranha e quem olhava de fora não entendia dieito, até porque não sentia muita falta, mas sabia que nem tudo eram rosas. Até agora, a História está sendo escrita, e os pássaros só conversam entre si, mas cada vez tomam conhecimento de sua força. Pode ser que pela manhã tenham voltado à guerra, ou até tenham sido vencidos pelos donos da gaiola, mas até lá, tudo o que há a perder é o medo de que nada se ganha ao se jogar nessa "imansidão plena de promessas" que é a luta.
2 Comments:
... e as canções parecem voltar. Com timbres diferentes, que num primeiro momento nos incomodam. Parecem não fazer sentido. Mas, de novo, vem a História e mostra o contrário.
"Indiscutivelmente há muito de neurótico no que se refere ao passado: gestos de defesa onde não houve agressão; sentimentos profundos em situações que não os justificam; ausência de sentimentos em face de situações de maior gravidade; e não raro também a repressão do conhecido ou do semiconhecido."
Theodor Adorno, voce já deve saber.
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